Transição energética é foco da Força-tarefa de Finanças e Infraestrutura do B20
Publicado em 29 de fevereiro de 2024“Precisamos transformar as finanças em um motor que vai mover um novo modelo econômico com base em uma energia mais limpa” afirma Luciana Ribeiro, líder do grupo
Melhorar os investimentos e a infraestrutura nas maiores economias do mundo para apoiar desenvolvimento social e diminuir a emissão de gases de efeito estufa. Esse é o principal objetivo da força-tarefa de Finança e Infraestrutura do B20, o fórum empresarial dos países do G20.
O grupo atua tanto em questões relacionadas ao sistema financeiro, quanto à infraestrutura física. Ou seja, as preocupações vão desde acesso ao capital até a construções resilientes e sustentáveis, em um cenário de mudanças climáticas.
O desejo mundial de avanço dessas questões não é novidade, mas a conquista do cenário ideal ainda é um desafio. Quais seriam, então, as medidas necessárias para um efeito global positivo (de preferência, rápido)?
É essa a resposta que 130 executivos brasileiros e estrangeiros da força-tarefa trabalham para ter nos próximos meses. Após a troca de ideias e experiências dos empresários de mais de 20 países do G20, o grupo vai elencar as recomendações prioritárias de políticas públicas para alinhar com os demais fóruns e, em seguida, apresentar aos chefes de Estado na reunião geral do G20 Brasil, em novembro. Ao todo, o B20 é composto por oito grupos temáticos: sete forças-tarefas e um conselho de ação.
Nesta matéria você vai entender:
O que faz a força-tarefa de Finança e Infraestrutura do B20;
Quais são os focos de trabalho do grupo;
O que é financiamento climático;
Como o Brasil pode contribuir para essa agenda;
Como o setor privado mundial pode atuar nesse esforço;
De que forma os investimentos climáticos impactam o desenvolvimento social;
Quais são os principais desafios para a agenda de finanças e infraestrutura;
Aspecto financeiro é crucial para descarbonizar economia e eliminar a fome
A força-tarefa de Finanças e Infraestrutura é comandada pela executiva brasileira Luciana Ribeiro, cofundadora da eB Capital e presidente do Brazil Climate Summit (BCS), evento que mostra o papel do Brasil na trajetória global de descarbonização. Considerada uma voz líder em investimentos relacionados a respostas a mudanças climáticas, Luciana acredita que a infraestrutura financeira é crucial para avançar na descarbonização da economia e no combate às desigualdades sociais.
“O mundo está passando por uma transformação, os extremos climáticos estão cada vez mais frequentes. Por isso existe um movimento de governos, de investidores e de consumidores exigindo a adaptação climática. Os negócios precisam se ajustar para modelos menos poluentes e as infraestruturas precisam se adaptar a este cenário”, diz a líder da força-tarefa.
Infraestruturas adaptadas para lidar com os efeitos climáticos
Quando a gente fala de adaptação climática, são ações feitas pela sociedade em resposta aos efeitos adversos das mudanças climáticas, como substituição de pontes, realocação de estradas e criação de espaços verdes para melhorar a drenagem das águas das chuvas, por exemplo.
Adaptar infraestruturas globais para que as economias consigam lidar com efeitos climáticos extremos, como desastres naturais, deslizamentos de terra, secas e enchentes, exigem muitos recursos.
As discussões do tema pelas principais economias são fundamentais porque abordam mecanismos de financiamento, infraestruturas físicas tradicionais, digitais e sociais. “Quando pensamos em energia limpa, pensamos em substituição do petróleo, do carvão, do gás natural. Mas tão importante quanto substituir é investir na infraestrutura necessária, seja para fazer o transporte das novas fontes de energia, seja para ter as baterias para armazenamento. Por isso investir em infraestrutura que garanta a transição energética é tão importante”, explica Luciana.
O que é financiamento climático?
De acordo com a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês), os recursos para financiamento climático podem ter origem local, nacional ou transnacional e partir de fontes públicas, privadas ou alternativas, como as entidades filantrópicas. O financiamento tem como objetivo principal promover a transição para uma economia de baixo carbono e o desenvolvimento sustentável, além de impulsionar a adaptação às alterações climáticas.
A agenda do financiamento climático teve um crescimento significativo nos últimos anos, segundo o Climate Policy Initiative (CPI), que há mais de 10 anos acompanha o andamento de investimentos climáticos mundiais. Pela primeira vez, de acordo com a organização, os fluxos médios atingiram a base dos trilhões de dólares. USD 1,3 trilhão foi investido, em média, em financiamentos climáticos entre 2021 e 2022, quase o dobro na comparação com os níveis de 2019 e 2020.
“Isso é um grande avanço, mas vale ressaltar que os fluxos atuais equivalem apenas a cerca de 1% do PIB mundial. E se formos atender as estimativas de demanda, eles fluxos teriam que crescer cinco vezes por ano”, explica a gerente de financiamento climático do CPI e professora da Escola de Assuntos Internacionais de Paris (PSIA, na sigla em inglês), Priscilla Negreiros.
Para a especialista, é preciso agir de forma concertada em todos os setores da economia.
“A redução das emissões, juntamente com a substituição dos combustíveis fosseis, terá um custo. Mas o custo de não fazermos uma transição para uma economia de baixo carbono será ainda maior”, alerta Priscilla.
Quais são os principais desafios para a agenda de finança e infraestrutura?
Apesar dos avanços na estruturação de investimentos verdes, países em desenvolvimento ainda têm dificuldade de mobilizar capital para essas questões.
A especialista Priscilla Negreiros chama atenção para o desafio da equidade na distribuição dos investimentos para o clima. “Os fluxos de financiamento continuam direcionados principalmente aos países desenvolvidos, com uma parcela muito pequena chegando aos países em desenvolvimento e de baixa renda”, afirma.
Segundo levantamento do CPI, menos de 3% do total global foi destinado aos países menos desenvolvidos, enquanto apenas 15% foram para os mercados emergentes e países em desenvolvimento, excluindo a China. Os dez países mais afetados pelas mudanças climáticas receberam apenas uma fração do financiamento necessário.
A mitigação de risco e colaboração internacional também é um desafio nas discussões do setor privado do G20. Para a líder da força-tarefa de Finança e Infraestrutura, o desenvolvimento dessas colaborações deve acelerar a resiliência dos sistemas financeiros, uma vez que há preocupação das empresas em investir nos países onde o câmbio apresenta muita variação.
“No B20, discutimos exatamente quais são os mecanismos para mobilizar o capital de bancos mundiais, entidades filantrópicas e governos de forma geral, não só no Brasil, mas mundialmente, para garantir a redução de riscos que não serão assumidos pela iniciativa privada. O setor só se mobiliza se existirem instrumentos que ofereçam condições adequadas de risco e retorno”, explica Luciana.
O que o Brasil tem feito para mobilizar capital para enfrentar as mudanças?
Os mecanismos inovadores de financiamento também são foco do grupo de discussão do B20. Os estímulos são considerados fundamentais para variar as fontes de investimento e melhorar a eficiência e o acesso aos fundos, principalmente nas economias em desenvolvimento.
“O sistema financeiro internacional – público e privado – precisa fazer um salto significativo na quantidade e qualidade do financiamento climático. E isso significa, na prática, reformar os fundos existentes e pensar em inovação financeira para vencer barreira”, acredita Priscilla Negreiros, do CPI.
As discussões sobre alterações climáticas e mobilização de capital ganham força em todo o mundo e o Brasil também tem trabalhado para estruturar instrumentos nesta agenda.
Um exemplo é o Programa de Mobilização de Capital Privado Externo e Proteção Cambial (Eco Invest Brasil), voltado para incentivar investimentos estrangeiros em projetos sustentáveis no país e oferecer soluções de proteção cambial, para que os riscos de variação de câmbio sejam menores.
A iniciativa propõe estimular maior integração das empresas brasileiras com investidores e sistema financeiro internacional e impulsionar os investimentos verdes no Brasil. O programa será realizado em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Central (BC). O BID vai viabilizar US$ 5,4 bilhões (27 bilhões de reais) – US$ 3,4 bilhões para operações de swap, contra variações excessivas do dólar em relação ao real, e US$ 2 bilhões em linhas de crédito.
“Lidar com a questão climática, com os investimentos mais longos, com o risco de quem vem de fora, nunca foi fácil. Mas hoje não temos mais a opção de ter investimentos com montante menor, temos obrigação de saber como resolver os problemas antigos pra questões que atualmente são muito mais urgentes do que no passado”, disse o presidente do BID, Ilan Goldfajn, durante a apresentação do Eco Invest Brasil.
Como o setor privado mundial pode contribuir com essa agenda?
Há um empenho dentro e fora do Brasil para estruturar financiamentos verdes, mas o caminho é longo. Um levantamento da Agência Internacional para as Energias Renováveis (Irena, na sigla em inglês) reforça a necessidade de empenho para evitar ou minimizar danos causados pelas mudanças climáticas. Segundo a instituição, são necessários investimentos de US$ 150 trilhões, em nível mundial, para limitar o aquecimento global até 2050 em 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais.
Para Priscilla Negreiros, a resposta a essa emergência climática não terá origem apenas no setor público. “O setor privado desempenha um papel fundamental na agenda climática. Dentro do grande escopo há diversos atores com funções e oportunidades distintas de investimento: bancos comerciais, fundos de pensão, corporações e até indivíduos”, analisa.
De acordo com dados do Climate Policy Initiative, o setor privado mundial já contribui com 49% do financiamento climático total, totalizando 625 bilhões de dólares. Ainda segundo a instituição, considerando o exemplo brasileiro, a maioria do financiamento climático para uso da terra no Brasil (entre 2015 e 2020) foi de recursos privados alavancados por políticas públicas (crédito rural) – ou seja, dois terços do financiamento doméstico (R$ 15,9 bilhões por ano).
“Isso é muito significativo. Há um potencial enorme de usar escassos recursos públicos para catalisar mais financiamento privado – e nossos bancos de desenvolvimento e setor público nacional devem ser catalizadores”, avalia Negreiros.
Para Luciana Ribeiro, na fase em que estamos já existem o mapeamento e as soluções prontas. “O que falta, então? Falta escalar essas soluções e, basicamente, precisamos de financiamento. Precisamos transformar as finanças em um motor que vai mover um novo modelo econômico com base em uma energia mais limpa” afirma a executiva.
De que forma o investimento na agenda climática impacta o desenvolvimento social?
Os impactos negativos da mudança climática, como os eventos climáticos extremos, podem piorar as desigualdades, reduzir a renda, diminuir a resiliência e impedir o desenvolvimento das comunidades afetadas. De acordo com o Banco Mundial, se o mundo não adotar medidas de caráter urgente, os impactos causados pela mudança climática poderão levar mais 100 milhões de pessoas à pobreza até 2030.
Aumentar o investimento nesse aspecto significa promover melhorias na qualidade de vida da população e criação de empregos. Segundo relatório da Comissão Mundial sobre a Economia e o Clima apresentado em 2018, a adoção de medidas climáticas ambiciosas poderia proporcionar um lucro econômico de 26 bilhões de dólares até 2030 e criar 65 milhões de empregos com baixas emissões de carbono.
Fonte: Assessoria