QUARENTA ANOS DA NOVA REPÚBLICA

Publicado em 15 de março de 2025

No distante 15/03/1985 – há quarenta anos –  o vice-presidente da república José Sarney prestou juramento no Congresso Nacional, e assumiu a Presidência da República. Eleito de forma indireta pelo Colégio Eleitoral, composto por deputados federais, senadores da república e delegados partidários de cada Estado da Federação, indicados pelas presidências das principais legendas, PDS/PMDB/PFL/PDT.

O Colégio Eleitoral foi criado na reforma constitucional de 1967, com o Congresso Nacional fechado por Castelo Branco. Ulysses Guimarães, na época um dos principais líderes do governo miliar, apoiou o ato. Era deputado federal (SP), já havia votado em Castelo Branco no dia 09/04/1964, para Presidente da República, após o Congresso ter decretado vacância do cargo, e assumido provisoriamente a presidência da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli. O Colégio Eleitoral foi inspirado no norte-americano. Vence a eleição quem obtiver a maioria dos delegados. A diferença é que nos estados Unidos o povo vota diretamente. Mas, pode perder para o Colégio.

João Goulart era o vice de Jânio Quadros, assumiu com sua renúncia e havia deixado o Brasil no dia 01/04/1964, asilando-se em sua Estancia no Uruguai. A Constituição vigente estabelecia eleições indiretas para um mandato “tampão”. Em 1965 ocorreria eleições gerais no país. Mas, quatro Atos Institucionais impediram o pleito de 1965. Prorrogaram o mandato do presidente Castelo Branco até 1967, porém, não suspenderam as eleições para governadores – com mandato de quatro anos – Câmara dos Deputados e Senado da República. A Constituição após redemocratização em 1947 criou os Estados Unidos do Brasil. Em alguns Estados (todos autônomos e com suas Constituições) o mandato de governador era de quatro anos. Em outros, de cinco anos. Entretanto, o mandato presidencial foi fixado em cinco anos.

Infelizmente, o genial Jornalista Stanislaw Ponte Preta, pseudônimo de Sérgio Porto, já havia falecido por ocasião da instalação da “Nova República”, “Redemocratização” ou fim do regime Militar. Ele teria classificado o evento como mais um “samba do crioulo doido”, frase de sua autoria. O regime militar se encerrou no dia 15/03/1979, com a posse do presidente João Batista Figueiredo. Geisel, antes de passar-lhe a faixa presidencial, havia revogado 16 Atos Institucionais, inclusive o temível AI-5.

O presidente Figueiredo era um general da reserva, eleito pelo Colégio Eleitoral, derrotando um forte adversário, Euler Bentes Monteiro (MDB). Ambos sabiam do seu papel: implantar a transição democrata. Geisel determinou a volta dos militares para a caserna, e tudo que foi proibido estava doravante liberado. Censura prévia, censura de costumes, direitos de greves, manifestações, liberdades de expressão e opinião. Não existiam mais poderes para cassação de mandatos, nem intervenções. Todos os projetos do governo Figueiredo foram votados pelo Congresso Nacional.

Uma ampla reforma política foi feita pelo Congresso, criando o pluripartidarismo. Surgiram dezenas de legendas, incluindo as proscritas desde 1948, PCB – Partido Comunista Brasileiro (linha Moscovita Leninista) e seu dissidente PCdoB, Partido Comunista do Brasil, alinhado a internacional socialista de Trotsky, estigmatizado e rotulado pelo PCB como “esquerda festiva”. Anistia ampla, geral e irrestrita foi concedida a todos os brasileiros. Perdoaram terroristas, assassinos, sequestradores, cassados das instituições como Universidades, OAB, dirigentes de Estatais. A Lei retroagia até 1962, quando houve escaramuças de golpe para derrubar João Goulart.

Sarney nunca sonhou ser presidente, muito menos Tancredo Neves. Os pré-candidatos eram o vice, Aureliano Chaves, o ministro do Interior Mário Andreazza, ex-governador de Minas, banqueiro Magalhães Pinto e, por fora, Ulysses Guimarães vinha visitando o país como provável alternativa. Pegando todos de surpresa, o deputado federal de primeiro mandato Dante de Oliveira, em março de 1983, colheu assinaturas suficientes para apresentar a PEC nº 5, propondo eleições diretas para a Presidência da República em 1984. Um grande movimento tomou conta do país. O PDS rachou, surgiu o PFL. O MDB também dividiu-se, e Tancredo Neves criou o PP. Se o projeto das “Diretas Já” fosse aprovado por 2/3 do Congresso, o candidato seria Franco Montoro, MDB-SP, apoiado por sete governadores, banqueiros, empresários e a grande mídia nacional.

 Chegado o dia da votação plenária um ano depois, 25/04/1994, por falta de 22 votos, com 62 abstenções e mais de uma dezena de ausentes, a PEC das “Diretas Já” foi derrotada. Mudou tudo e rapidamente. O ex-governador Paulo Maluf se lançou candidato. As eleições, foram marcadas para 15/01/1985. Maluf em ação destruiu as pretensões de Aureliano Chaves, Magalhães Pinto, dentre outros. Enfrentou nas convenções Mário Andreazza, candidato do presidente Figueiredo, e o derrotou.

O deputado federal Fernando Lyra (PE) desde 1983 vinha articulando a candidatura de Tancredo Neves, governador de Minas Gerais. Convenceu Aureliano Chaves a apoiar seu adversário histórico. Fernando Henrique Cardoso foi o emissário de Franco Montoro para levar o apoio do MDB a Tancredo. José Sarney – líder do PDS – com a derrota de Mário Andreazza desfilou-se do partido. Para acomodar todos, criaram a Frente Liberal e lançarem Tancredo. PP e MDB se fundiram, surgiu o PMDB. Atraíram dissidentes do PDS/PFL/PDT e PTB. Na disputa pela vice, puseram um “tertius”, o Senador do Maranhão José Sarney. O PMDB o engoliu seco.

No dia 15/01/1994 o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo Neves com 480 votos, contra Paulo Maluf (180 sufrágios). Logo em seguida, foi diplomado. A posse ocorreria 60 dias depois, 15/03/1995. No dia 14/03/1995 Tancredo assinou todos os atos, nomeando antecipadamente seus ministros. Mas, à noite, com forte crise de apendicite foi levado às pressas para o Hospital de Base em Brasília e cirurgiado. O general Leônidas Pires Gonçalves, escolhido por Tancredo como Ministro do Exército, por volta da meia noite recebeu ligação do SNI, informando o quadro de saúde do Presidente.

Vestiu sua farda, pôs sua pistola no cinto e chegou ao hospital. Um grupo reunido já havia decidido. Ulysses Guimarães – presidente da Câmara – seria empossado provisoriamente, até a volta de Tancredo. Com a Constituição na mão, e tropas de prontidão, ligou do hospital para Sarney e assegurou que ele seria empossado como vice. Assumiria o governo até Tancredo reestabelecer-se, ser empossado e receber a faixa presidencial. Determinou até o horário, pela manhã, por volta das 10hs.

Indignado, considerando Sarney um traidor, Figueiredo não foi lhe passar a faixa. Estava em Palácio e retirou-se com a chegada de Sarney e sua comitiva. Vinte e seis dias depois, faleceu Tancredo Neves. Sarney passou cinco anos como Presidente da República. Para os místicos, é o destino. O poder escapou das mãos de quem sempre sonhou ser presidente, e caiu no colo daquele que jamais esperou presidir o país. Hoje existe a História Oficial, que batizou o evento como “Nova República”, as estórias fantasiosas, que enxergaram o fato como “redemocratização”, versões revanchistas que classificam como o fim da “Ditadura Militar”, e a “memória sensata” dos que testemunharam os verdadeiros acontecimentos.

Fonte: Da Redação (Por Júnior Gurgel)