Valberto José
Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.
Quando uma mãe se supera
Publicado em 9 de maio de 2023Em instantes distintos na distância de 20 anos, minha mãe ficou sem o caçula dos 13 filhos que gerou e testemunhou a minha dor ao tumular um dos três netos que lhe dera. Ambos em situação semelhante na opção extrema de cada um, em momento de aflição e desesperança.
Dona Cleonice superou a perda filial com uma serenidade impressionante, dignificando a fé que processa. Sem escândalo, sem revolta, sem blasfêmia.
“Oh, meu filho, que dor que estou sentindo! Só Deus é maior do que essa dor”, disse, ao nos encontrarmos cinco horas após o impacto da notícia, naquela noite de concussão familiar.
Quando, há um ano e quatro meses, fui impactado com o gesto extremo de Glauber, foi de quem primeiro me lembrei; também me espelhei no seu exemplo de fé na tentativa gradual de superação. Apenas venho amenizando a dor, embora transpareça uma fortaleza que surpreendeu até parentes próximos.
Minha mãe ficou o tempo todo ao meu lado, no velório e na difícil caminhada até o local do adeus derradeiro. Lá, sentou-se junto de mim e presenciou todo processo, as falas amigas, o fechar e o descer do esquife.
Após o passamento do mano Joab, na prematuridade de seus 28 anos, minha mãe vivenciou outros lutos, a exemplo de quando papai se foi e no último adeus de minha avó, aos 100 anos. Em todos, manteve a serenidade inabalável, na reclusão íntima de seus sentimentos.
Em maio do ano passado, quatro meses após a explosão da minha dor, tive a oportunidade de dimensionar a sua, nessas perdas eternas. Também o seu poder de superação, na sua determinação silenciosa de me consolar na agonia paternal de meu peito dilacerado.
Fui com dona Cleonice ao velório de sua tia Maroquinha, que em dia daquele mês materno morrera aos 102 anos. Formamos um trio de saudade com sua prima Goretti Gama, também sobrinha da centenária.
Após a recomendação do corpo, seguimos em cortejo em direção ao jazigo. A certa distância do local, já divisando os movimentos dos trabalhadores fúnebres, a prima sustou os passos e pediu para que ficássemos ali.
“Não gosto de ver, Cleonice, pois vi tudo do de mamãe”, justificou Goretti, que vivenciou a orfandade materna aos 16 anos.
“Eu também não, Goretti. Desde que perdi o meu filho Joab que não olho. Mas eu ver o filho passando pela mesma dor que eu passei e não ficar ao lado dele…”