Valberto José

Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.

Quando o demônio se rende à santidade

Publicado em 4 de janeiro de 2024

No Dia de Santa Luzia, em dezembro último, recebi um vídeo com a música Santa Luzia, linda interpretação do grupo musical Demônios da Garoa em homenagem à santa padroeira dos olhos. De imediato, repassei-o aos meus poucos amigos de fé, aqueles que prezam por nossa amizade e que, assim como eu, cultivam um grão de mostarda, vivenciando uma religiosidade prática em busca do descanso eterno.

O repasse a Marcos Marinho foi acrescido da mensagem “é muito lindo”. Cristão e católico, ele gostou do que ouviu, mas enviou uma advertência com ressalvas ao nome do tradicional grupo paulista de samba. “Continuo com a velha tese de que onde existe DEMÔNIO nada pode mesmo ser lindo. Mas…”, provocou o amigo, reação que me levou a refletir sobre designação dessa natureza e que funcionou como premonição do que eu viria a assistir no último dia do ano.

Inicialmente, passei a me perguntar se não seria um contrassenso o nome demônio em um grupo musical num país predominantemente cristão e até se não houve protesto. A resposta obtive no último domingo do ano, vendo Balaio, novo programa da TV Cultura, apresentado por Renato Teixeira e Chico Teixeira, pai e filho, em substituição ao programa de Rolando Boldrin nas manhãs de domingo.

Líderes do grupo, o decano Sérgio Rosa e seu filho Ricardinho Rosa, este da terceira geração, falaram que o conjunto surgiu, inicialmente, como Grupo do Luar, nome que encontrou resistência pejorativa, por lembrar o jogo do bicho. Numa apresentação em auditório de rádio da época, o locutor chamou seus componentes de endiabrados, motivando a sugestão anônima, em outro programa, da denominação Demônios da Garoa.

A dupla confirmou que tiveram problemas quando eles se apresentaram em São Luiz do Anauá, cidade interiorana de Roraima, pois 100% dos moradores seriam evangélicos. Foi necessário um carro de som sair pela cidade anunciando o conjunto de samba paulista “Anjos da Garoa”.

Há muitas contradições na vida, e o nome Demônios da Garoa, no meio artístico, é uma delas. Roberto Carlos já quis mandar tudo para o inferno, mas depois avisou: Jesus Cristo, Jesus Cristo, eu estou aqui; os Mamonas Assassinas não mataram ninguém, mas sucumbiram nas asas do destino. “Mas…” – meu amigo – … é lindo quando um demônio se rende à santidade.