

Valberto José
Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.
Quando o cliente nos surpreende com sua arte
Publicado em 20 de janeiro de 2025A vivência comercial reforça a tese de que “ninguém conhece ninguém completamente”. Passados seis anos do fechamento do nosso açougue, alguns clientes ainda se pasmam em saber que o açougueiro que os atendeu no passado também é jornalista. Assim como me surpreendi três anos depois conhecendo os desenhos realistas do amigo Herbert Oliveira. Espetacular!
Herbert nos proporcionou uma fidelidade mercantil desde o seu retorno definitivo para Campina Grande, finda quando cerramos as portas em janeiro de 2019.
Digo sempre que não tenho saudades do açougue, mas dos clientes amigos que fiz, Herbert um deles. Além de comprar bem, nos deixava à vontade no manuseio da peça de sua carne preferida. “Agora tire toda gordura”, dizia sempre, depois de pesada.
Enquanto trabalhávamos no seu pedido, ficava escorado na porta, um pé na calçada e outro no batente, às vezes fumando, de onde brincava com todos. Nunca esqueci da vez que ele chegou e disse: “bom dia, meu amor”, olhando para Margarida. Freguesa ao lado, ouvindo, direcionou seu olhar arregalado para mim e perguntou se eu não ficara com raiva. “Se fosse meu marido era uma briga”.
Outra vez, já atendendo um cliente que exigia rapidez no aviamento de sua mercadoria, ele se aproximou do balcão e começou a falar coisas que eu nem entendia. Na pressa em aviar o pedido, parecia eu transparecer um certo nervosismo. “Não fique nervoso não, que é brincadeira”, avisou.
Foi pegando carona no Facebook de minha mulher, antes de aderir às redes sociais, que descobri a veia artística do amigo. Fiquei encantado. Um exímio desenhista! O desenho da netinha Sofia ainda novinha é perfeito, outro ela já maior ficou melhor do que a foto que serviu de modelo. Também há perfeição no desenho de seu saudoso irmão Rui, de óculos, barba e cabelos grisalhos.
Herbert chegou a trabalhar no Diário da Borborema nos anos de 1970, convidado por Guedes, um dos diretores. Fazia artes para anúncios do setor comercial e raramente charges, pois o jornal contava com os chargistas Afonso Marreiro e Marcone.
Ele atribui o desconhecimento do seu trabalho em Campina Grande por ter passado muito tempo fora da cidade. Foram oito anos no Rio de Janeiro e 30 em Brasília, sempre trabalhando em agências de publicidade.
Durante a pandemia, Herbert, que tem no desenho realista o seu hobby, intensificou sua brincadeira, isto é, seu trabalho, feito a lápis. Ele usa um conjunto de lápis alemão composto de 36 números diferentes. Não há necessidade de usar todos, pois o mais importante do trabalho é a técnica de desenhar, garante.
Essa técnica é aplicada nas sombras, brilhos e, principalmente, rugas e cabelos brancos. Para obter um efeito que espelhe a realidade fisionômica da pessoa desenhada. “Dá muito trabalho”, diz. Mas o resultado é um realismo que impressiona. E encanta.