Amaro Pinto
Advogado, Cronista, Articulista paraibano. Fascinado, humilde e curioso aprendiz do Direito, Literatura, Teologia e Filosofia. Avante – sempre – porque somente DEUS é grande.
O DANTESCO E O GROTESCO.
Publicado em 26 de abril de 2024Ao longo da vida (e já se vão mais de seis décadas) – sempre cri na Humanidade de forma pia e honesta, apesar do rosário interminável de coisas vis e abjetas a olhos vistos observadas na vida, e principalmente no exercício ininterrupto da Advocacia há 37 anos, pela Graça Divina – pois.
O humano e tudo que o acompanha, por natureza, essência e finalidade, é para mim objeto de constante estudo e reflexão, eis que traz em si um caldeirão repleto de situações muitas vezes inexplicáveis e estarrecedoras, nunca, porém, surpreendentes – no dizer repetido, fundamental e exaustivo, mas não exauriente de Terêncio, secularmente.
Na vida em modo amplo e geral, todos nós vimos de tudo, seja nas relações interpessoais, profissionais, de amizade e até de pouca convivência, mesmo no que pertine a laços hereditários de ascendentes, descendentes, afinidade e colateralidade, amizade, até – por meio dos quais que é vezeira a ocorrência de fatos capazes de provocar asco em pedras. Urra!
A Humanidade por ser gregária produz essas situações asquerosas, e como é antinômica – também causa vezos de candura, solidariedade, fraternidade e amor. Assim é, porque assim somos, todos nós, humanos e semelhantes, de modo indistinto e indelével – também a atravessar gerações, passadas, presentes e futuras.
Na Advocacia (no meio Judiciário como um todo) também vimos e vemos de tudo, todo santo dia, e não precisa do esboroar de tempo que este escrevinhador temporão possui na nobre profissão: basta receber a “vermelhinha” ( a Carteira da OAB) e passamos a ver de que é capaz e para além o humano.
Eita Humanidade feraz, cruel, injusta e acima de todas essas mazelas – ingrata.
Nos palcos forenses se desenrola o pior que a natureza humana possui e regurgita aos borbotões intermináveis e sucessivos, tal lavas vulcânicas, agravadas pela putrefação.
Ao contrário da Medicina, em que ocorre muito dos erros serem sepultados com os defuntos vítimas de “cuidados” inadequados, por assim dizer, com eufemismo – no meio Judiciário toda a sordidez e abjeções humanas sai dos esgotos mais profundos e ganha o mundo em rapidez meteórica, ainda mais nesses caóticos tempos cibernéticos e fake news e dos doutores “sabe-tudo” do Googlão.
Dias atrás, sem nenhuma supresa, a natureza humana produziu um desses espetáculos deprimentes e pútridos em que uma sobrinha levou o tio dela morto a uma agência bancária para tentar aplicar um golpe na Instituição Bancária e nos demais herdeiros do defunto, ainda quente, porquanto falecera em torno de duas horas, talvez menos.
De bate-pronto, as línguas viperinas e os atiradores de pedras sempre de plantão puseram-se à obra de promover, não somente o julgamento e condenação antecipados da dita sobrinha – como, e sobretudo, leva-la à execração e linchamento públicos, sem demora, imediatamente.
Não fora a atuação (e autuação) serena e prudente do nobre Delegado de Polícia Civil encarregado do caso, essa indiciada (inclusive técnica e legalmente de modo impecável, no que se refere, até este momento, nos crimes em tese, que lhe foram atribuídos) – a tal sobrinha a essa altura já estaria despedaçada com cabeça, troncos e membros encimando postes, esquartejada pela plebe rude e ignara, sedenta e esfaimada. Toda composta por pessoas ditas de “bem”, pregadores dos Santos Evangelhos e que tais e toda a escumalha fétida lhes que faz ressonância.
A boa e velha Natureza Humana, imperfeita, nem (de todo) angelical nem maldosa – humana apenas – como todos nós outros, sujeita a errar e acertar a cada batida do coração, até o fim. Mais nada.
Os latinos ensinaram mellius in virtus (a virtude está no meio) e a já referenciada conduta da autoridade policial pôs a termo os iracundos de plantão.
É certo que a cena vista num átimo de segundo é de fato estarrecedora e repugnante, a transmitir uma gelidez de morte (sem trocadilho) até porque aquele corpo do idoso morto ainda não possuía sinais de finitude impossíveis de não se ver ao resvalo de um olhar à esguelha, como livores violáceos e rigidez cadavérica, de tal forma a permitir que qualquer pessoa com experiência médico-legal e até do meio judicial ou policial antevisse de logo que o falecimento se dera antes de duas, (talvez menos) quatro ou seis horas do momento em que a cena macabra ocorreu e foi amplamente filmada dentro do Banco e depois amplamente divulgada no mundo inteiro.
É uma cena de terror, de fato, a induzir o que de pior o ser humano possui. É muito desprezo a um ser humano conduzido em um quadro abjeto de revirar estômagos de zinco. Sim, isso é incontestável.
Entretanto, o passar das horas e agora dos dias começa a revelar outras nuances que se não apagam o horror do momento, podem trazer à tona circunstâncias capazes de modificar a moldura da realidade do que efetivamente ocorreu, em toda a sua latitude e longitude.
O joeirar da prova é a alma do processo, como prelecionava Nelson Hungria. E para se chegar a tal conclusão é necessário e indispensável que se dê lugar ao fenômeno da decantação, de forma que a borra desça e as águas se transmudem em cristalinas.
Essa verdade científica vale para tudo na vida, ainda mais em julgamentos humanos no fragor de acontecimentos ingentes, nos quais as chamas da vingança privada se sobrepõem à serena justeza dos pensamentos.
Até agora, para além de qualquer discussão sobre culpa em sentido amplo, tem-se a cena dantesca e grotesca de um idoso morto em uma cadeira de rodas levado pela sobrinha no intuito de se fazer um empréstimo bancário, o qual não se consumou exatamente pelo evento-morte do tio da indiciada.
Outras fontes de prova também apontam para uma existência repleta de internações decorrentes de doenças mentais da sobrinha, presa preventivamente, a também se permitir que uma instrução processual bem feita possa eximi-la de que não possuía qualquer discernimento quanto ao caráter criminoso do fato eventualmente praticado.
É cedo – muito cedo – para se chegar a conclusões definitivas: o devido processo legal haverá de esclarecer tudo, em seu tempo e forma certo, até porque “ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” – (Princípio da Presunção de Inocência ou da Não-Culpabilidade, como queiram a todos os gostos, proncipalmente os juristas do Googlão) – neste país extraordinário.
Nunca custoso relembrar.
Até lá sobrelevam o dantesco e o grotesco – seja na cena macabra em si, seja na abjeta intenção de se linchar pessoas sem julgamento justo.
“Assim é, se lhe parece” (Luigi Pirandello).
E não perdi minha fé na Humanidade – mercê da Soberana Graça da Divina Providência.
Vade!
Avante porque somente DEUS é grande!
Amaro Pinto, 24 de abril de 2024.