Valberto José

Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.

O bem dos netos

Publicado em 1 de agosto de 2024

Como o pescador da canção de Caymmi, o avô tem dois amores. Um bem que sai da casa da gente, e um bem que chega e se aconchega na casa da gente. O bem que sai traz o que chega, que só nos faz bem. Muitíssimo bem! No meu caso, na idade que minha dupla descendente está, até na solidão de minhas tardes me faz um bem.

Tenho quebrado a promessa que fiz a mim mesmo de colocar esta coluna “no ar” logo no segundo dia da semana. A matilha hospedada em casa, formada a partir da sexta-feira, conspira contra essa determinação pessoal, embora outros ruídos caseiros ajudem nesse retardamento involuntário. Se não fosse o bem dos netos, a pontualidade semanal estaria comprometida.

Na crônica “Choro de menino”, publicada no livro Notas do meu lugar, Gonzaga Rodrigues põe no barulho insistente de uma criança a conta de não colocar no papel a ideia que ocorre na cabeça. “Fico ajeitando o papel na máquina à espera que a menina pare de chorar e gritar”, queixa-se.

No recinto sagrado do meu lar, o ladrar das “crianças de quatro patas” corta o meu raciocínio, tirando o ritmo e impedindo a compreensão da leitura que costumo fazer, ou quebrando a frase que o teclar no computador estaria formando, quando escrevo; a mulher, parece endossar o refrão, regendo essa orquestra “cãofônica”.

Na verdade, é ela quem mais “afugenta o assunto e as palavras”. Conversando com os “meninos”, falando tudo que vai fazer com eles e para eles. “Vou botar sua ração agora, hoje você vai pro banho, para de latir, não faz (xixi) aí nãããão…”. O bom é que acaba controlando todos.

Sem a matilha, a ladainha continua, me atrapalha do mesmo jeito. Faz-me, à distância, perguntas que, se eu responder, não vai me ouvir; se estar no celular, sobe ainda mais a voz e amplifica o som quando recebe um áudio ou vídeo. É um desafio à minha reconhecida paciência.

Tenho conseguido ler ou escrever com mais tranquilidade, maior concentração e raciocínio mais rápido, no período da tarde. É quando ela está na casa da filha, ajudando a cuidar dos netos, e eu fico sozinho em casa. Os pequenos Miguel e José me fazem o bem maior quando chamam, através da mãe, pela avó.