Valberto José

Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.

Fórmula Bus na Almirante Barroso 

Publicado em 17 de maio de 2022

A radicalização das empresas de ônibus com a suspensão das linhas aos distritos e sítios me atiça a memória sexagenária e me devolve à infância feliz dos anos de 1960. Não sei precisar se a 68 ou 69, quando dois amigos, em sociedade, compraram uma “bicudinha” e criaram uma linha de ônibus encurtando a distância entre o centro e o sítio Lucas.

A iniciativa de Zezo e do sócio Rosemiro, ex-motorista do caminhão de uma distribuidora de gás, aguçou a inveja dos empresários concessionários da linha do Cruzeiro, bairro onde morei até os 12 anos. “Lucas, via Cruzeiro”, avisava o quadro de destinatário do veículo, incitando a disputa por passageiro.

O carro adquirido pela dupla era velho, mas conservado, e certamente não mais fabricado. Chamava-se “bicudinha” por causa do motor na dianteira, com o capô levemente reto como proteção e os dois para-choques cobrindo os pneus. Se o capô fosse inclinado, diria ser a frente de um Fusca gigante.

O nome está no feminino certamente porque esse tipo de transporte também era conhecido por lotação, marinete e até sopa, nomes criados sob a inspiração da gíria daquele tempo. “Vou pegar a sopa”, costumávamos ouvir.

Não recordo se quando os dois amigos habilitaram a linha, Agamenon, o seu Agá, já tinha colocado em movimento o seu ônibus para catar passageiros no percurso Campina Grande ao distrito de Catolé de Boa Vista. Acredito que sim.

Certeza mesmo é que os donos da linha do Cruzeiro moveram céus e terras no sentido de impedir a circulação do veículo da linha inaugurada. Em vão. Não conseguindo o intento, a opção foi uma marcação cerrada, visando a evitar que passageiros subissem os degraus concorrentes.

O ponto final da linha centro/bairro do Cruzeiro ficava na esquina da rua Francisco Lopes de Almeida com a professor Luiz Gil, tendo uma mercearia como apoio. O ônibus do Lucas encontrava apoio no bar e mercearia de Otoniel, no já habitado sítio.

Criança se diverte com briga de adultos. No domingo, eu e minha turma tínhamos pelo menos dois divertimentos certos, sendo o primeiro os jogos do Íbis, em campo onde hoje é a garagem da empresa Águia. O outro, presenciar a Fórmula Bus, como poderia ser chamada a disputa por passageiros entre os motoristas concorrentes. Achávamos engraçado.

Sem controle de qualquer órgão público, o motorista é que fazia o seu horário, conforme a lotação. Com a nova concorrência, a ordem patronal era de que o ônibus só saísse do ponto quando o do Lucas se aproximasse da ponte do riacho Bodocongó, a conhecida ponte do Cruzeiro.

Apesar da liberdade de horário, o condutor da vez não relaxava, pois ficava o tempo todo observando se a “bicuda” apontava na curva da Pelada, aquele trecho no alto, após a linha de transmissão da Chesf. Até na hora de tomar um café pequeno, ficava tenso, atento ao aparecimento do concorrente.

Bastava o carro bicar na curva da estrada empoeirada, o motorista, em segundos, quase sem pisar os batentes, pulava na cadeira e ligava o motor. Aí, controlava a ansiedade da partida, e só o colocava em movimento quando o outro estivesse em tempo de atravessar a ponte, iniciando o pega-pega.

Ainda lembro quando um deles, ao avistar o concorrente, correu e tropeçou no primeiro degrau, caindo de joelho. O riso geral foi contido pela austeridade da fisionomia espantada causando medo à meninada. Não é preciso dizer que a marinete do Lucas passou à frente e saiu apanhando os passageiros.

Nós, meninos, achávamos bonito o ziguezague dos ônibus disputando os usuários ao longo da avenida sem qualquer pavimentação, levantando poeira, um cortando o outro em busca do ponto com mais gente, transformando a Almirante Barroso numa pista de Fórmula Bus. Alguns dos colegas arriscavam “um circular” só para ver o corre-corre; eu, não.

RUA DA PELADA

Sem ao menos um campo de futebol de pelada que servisse de sugestão, não sei o motivo do trecho da Avenida Francisco Lopes de Almeida, que divide o Rocha Cavalcante das Malvinas, ser conhecido por esse nome, naquela época. Seus moradores não gostavam e preferiam chamar de Vila Doral.

VOCAÇÃO COMERCIAL

Hoje, o trecho é bastante habitado e começa a viver o auge de sua vocação comercial, com farmácias, três açougues, supermercados, etc. Recentemente fui visitar familiares em Livramento, no nosso Estado, e um dos primos, que há tempo não vem a Campina Grande, perguntou pela Pelada. “Rapaz, a Pelada hoje é tão cabeluda…”, respondi.

CIDADANIA

O goleiro Mauro Iguatu agora é Cidadão de Campina Grande. Pelo que tenho conhecimento, é o segundo arqueiro a ser agraciado com o título, mas o primeiro em atividade. O outro foi Jorge Hipólito, também com passagem por Treze e Campinense e que marcou também como treinador de goleiros.