Valberto José
Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.
De passagem pelas montanhas das Espinharas
Publicado em 28 de dezembro de 2024A leitura nos faz viajar na imaginação e na realidade. Presentear o amigo Jurandy França com o romance histórico A Passagem das Espinharas, da dupla Vanderley de Brito e Erik Brito, proporcionou a oportunidade de vivenciarmos, em menos de um ano após a leitura, a realidade do cenário da “magnífica cadeia de montanhas que cerca o Vale das Espinharas”, como bem define o prefácio do livro logo no “lead”.
Conheço a região desde a adolescência, quando morávamos em Patos, e vez por outra, nas constantes viagens de papai a Campina Grande, optava-se pelo único horário da empresa Patoense que “vinha por dentro”. Mas nada de me atentar à bela paisagem montanhosa que ela oferece aos nossos olhos.
Retornei de vez para a Rainha da Borborema em 1976 e não mais passei por lá. Uns sete anos atrás, tendo que viajar a Patos e sabedor de que a estrada ganhara pavimentação, optei pelo caminho antigo das Espinharas. Encantei-me pelo conjunto montanhoso! Desde então, quando vou ao Sertão, é um prazer transitar pela Serra da Viração na ida e encarar a Serra de Santa Luzia na volta.
Conforme Jurandy ia avançando na leitura da obra, comentava, com entusiasmo, os aspectos mais importantes. Terminado o “ato de decifrar o conteúdo escrito” por pai e filho, diante da empolgação do amigo, prometi-lhe um passeio até Passagem quando ele viesse à Paraíba, morador de São Paulo que é.
Chegou na quarta-feira (19), juntamente com o filho e a jovem e centrada mulher. No sábado, o trio estava admirando a beleza da sucessão de montes.
Saímos de Campina Grande pouco mais das cinco horas da manhã e ao tempo que o carro avançava, o filho André Muralha, pela primeira vez na Paraíba, admirava a vegetação característica do Cariri. “É muito cacto. É uma cactolândia”, definiu.
Quando passou de Assunção, ao vislumbrar os primeiros montes, André sacou sua Canon T3i e começou a captar imagens, mas ao avistar o “cânyon”, encantado, acelerou o flash. “Canyon, canyon, canyon”, gritava.
Pai e filho pareciam querer se estranhar, o velho demonstrando certa impaciência com as brincadeiras do herdeiro. “Parece Vanderley e Erik”, acabou, rindo, comparando.
Amantes da história e de objetos antigos, Jurandy e Leonora queriam conhecer o museu de Passagem. Por ser um sábado, temia-se pelo fechamento, como de fato comprovamos ao avistá-lo, assim que entramos na cidade.
Com sede, logo nos dirigimos ao Coreto, único boteco aberto no horário, mas sem ninguém para atender. Logo um senhor com certa dificuldade nos movimentos se aproximou e tomou seu lugar no estabelecimento. Jurandy pediu uma cerveja, e o filho, um refrigerante. Eu, piloto da expedição, tive que me contentar com um guaraná, embora o clima estivesse ameno.
Havíamos perdido a esperança de conhecer o museu, pois Seu Bonifácio confirmou o fechamento desde o recesso escolar e a abertura só em fevereiro, no retorno das aulas. Mas indicou falar com a moça de uma loja, que tem o contato da responsável. Enquanto nos refrescávamos, Leonora foi dialogar com ela. Letícia foi de uma presteza imensa, logo ligando para a “chaveira”, que garantiu estar reaberto no mês de carnaval.
Enquanto isso, no coreto, André resolve acender o seu cachimbo sem tabaco, à base de ervas (Malva, sálvia, hibisco, alfazema, camomila, hortelã, rosa rubra e calêndula), todos com olhar paquerador no Museu Adão Calixto. Inquirido se o cachimbo tinha fumo, o filho do meio de meu amigo confirma ser um mix de ervas que ele mesmo prepara. Num rasgo de improviso, brinco: teu cachimbo tem ervas, o museu tem Adão.
Já íamos embora, após rodar pelas ruas principais, quando, na saída, após a igreja, Leonora pede parada, pois quer uma foto na placa com o nome da cidade. Eu resolvo ir para cima da ponte, vislumbrar o monte, que, de tão próximo de onde eu estava, parecia ser mais alto.
Num instante, a voz alterada de Jurandy e o aceno chamativo de Leonora me despertam do enlevo momentâneo, confirmando que a moça, cheia de boa vontade, abrira o museu, após um homem num carro, outro numa moto e mais uma mulher lhes avisarem. Literalmente voltamos ao passado, o recente e o antigo. E ficamos imensamente agradecidos.