Brasil tem mais de 10 milhões de analfabetos jovens e adultos

Publicado em 9 de setembro de 2022

Mais de 10 milhões de brasileiros com 15 anos de idade ou mais não são alfabetizados. Desse total, 6,2 milhões vivem na região Nordeste. O levantamento é do Serviço Social da Indústria (SESI), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) de 2019.

No Dia Mundial da Alfabetização, comemorado nesta quinta-feira (8), os números convidam a uma reflexão. Alfabetizar significa muito mais que ler e escrever. Ser alfabetizado é ter a base de todo o processo educacional para avançar nas dimensões sociais, econômicas e políticas. É exercer o direito à cidadania.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) orienta que a alfabetização ocorra entre o 1º e o 2º ano do ensino fundamental. Na rede SESI, são 25,2 mil alunos matriculados nesse período.


“Os processos de alfabetização e letramento são complexos, mas fundamentais para a inclusão social. Com a pandemia, observamos que as crianças foram bastante afetadas, os estudantes de 7 e 8 anos que deveriam estar alfabetizados não conseguiram ter acesso. Os impactos desse atraso educacional serão refletidos em anos”, destaca a alfabetizadora Débora Mesquita, do SESI David Nóvoa Alvarez, de Iranduba (AM). 


Segundo a nota técnica “Impactos da pandemia na alfabetização de crianças” do Todos Pela Educação, o número de crianças de 6 e 7 anos não alfabetizadas aumentou 66,3% entre 2019 e 2021, passando de 1,4 milhão para 2,4 milhões,

A professora do 1º ano do ensino fundamental explica que, quando uma criança não é alfabetizada no período certo, há uma grande perda na sequência de aprendizagem, já que cada série é a continuação de um conhecimento previamente adquirido.

Quando uma criança não é alfabetizada no período certo, há uma grande perda na sequência de aprendizagem

Analfabetismo funcional atinge cerca de 1/3 dos brasileiros

Em função das fragilidades da educação básica, um alto percentual da população leva para a vida adulta déficits na capacidade de leitura, escrita e raciocínio matemático. O analfabetismo funcional, quando a pessoa reconhece letras e números, mas não consegue compreender textos simples nem realizar operações matemáticas, atinge cerca de 1/3 dos brasileiros.


“Os impactos mais visíveis para os não alfabetizados são a exclusão social, submissão e dependência de outras pessoas e até de serviços, pelo fato de não terem uma qualificação profissional, não podendo almejar empregos com remunerações melhores”, pontua a alfabetizadora de EJA Natália Muriel, do SESI Belém, no Pará. 

Segunda chance para aprender a ler

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é a segunda chance para aqueles que não tiveram acesso à alfabetização na idade correta. Foi o caso da Lilian Ferreira, 36 anos, estudante do SESI Chapecó, em Santa Catarina. Ela faz parte dos mais de 128 mil alunos da EJA SESI espalhados por todo o país.

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Nascida em Luís Domingues, interior do Maranhão, Lilian se mudou ainda criança para São Luís, capital do estado, junto com seus pais e sete irmãos. Ela teve a infância e adolescência marcadas por momentos difíceis.

Desde cedo, aprendeu a trabalhar em casas de famílias para ajudar no sustento, deixando de lado o seu sonho de frequentar uma sala de aula.


“Eu via as crianças passando pra ir pra escola e o meu sonho era poder pisar em uma sala de aula. Eu ia em uma escola perto do meu bairro pedir pra estudar e a moça falava pra eu levar alguém ‘de maior’ com a minha certidão, mas nem isso eu tinha”, relembra. 


Aos 18 anos, se mudou para Santa Catarina com o marido. Durante a trajetória profissional, ela trabalhou em serviços de limpeza, lavanderia, refeitório, até que aprendeu a soldar. A nordestina conta que praticava no horário do almoço e, aos poucos, foi adquirindo novas técnicas de soldagem e se desenvolvendo profissionalmente.

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Apesar da dedicação, o diploma da educação básica começou a fazer falta. Ela perdeu duas grandes oportunidades de crescimento profissional por conta disso e foi aí que decidiu, finalmente, realizar o seu sonho de criança: frequentar a escola.


“Pra quem não tem estudo é muito ruim. Quantas vezes eu cheguei no terminal de ônibus e tive que pedir ajuda às pessoas pra pegar uma lotação. Às vezes, você consegue ajuda, às vezes, não. Eu tinha medo de me perder, porque quando a gente não sabe ler, a gente é cego”, declara.  


Lilian ingressou na EJA SESI em 2021 sem conseguir escrever o próprio nome. Hoje, ela cursa o ensino fundamental e usa o que aprende no seu trabalho, o de soldadora da empresa Edge Automação Industrial.

“No meu trabalho, tudo é anotado. Hoje, na indústria, tudo que você faz, você precisa ir no computador e eu já até comecei a usar o computador. Aprendi a conferir as peças, incluir os números na planilha. Antes, eu não sabia nem qual número ia na frente ou atrás”.

Adultos e crianças: semelhanças e diferenças da aprendizagem

O processo para alfabetizar crianças e adultos é basicamente o mesmo e as funções cognitivas são semelhantes. No entanto, a pedagoga Natália chama atenção para a necessidade de aprendizagem da criança, que se difere do estudante adulto, e exige um olhar específico, tendo em vista que ele possui uma determinada identidade, ciclos de vida e traz consigo uma bagagem de conhecimento.

“Quanto aos desafios específicos da alfabetização de adultos, o maior é a motivação, incluindo o medo do insucesso e o sentimento de inferioridade, que são fatores socioculturais. Além da realidade do cotidiano, como o cansaço, as preocupações e prioridades que disputam sua energia, atenção e concentração”, lista.

Tanto na alfabetização de crianças quanto na de adultos, é necessário clareza no processo educacional e estratégias com materiais adequados para o ensino

Já na parte motora, a menor plasticidade cerebral pode dificultar a fluência na escrita, mas isso pode ser superado com treinamento e atividades de coordenação passados pelo professor.

“Pelo fato de a coordenação motora ser abalada no decorrer da idade, o aluno desenvolve algumas interferências, se torna menos ágil e o entendimento de certos conteúdos pode ser mais complexo”, conclui.

Tanto na alfabetização de crianças quanto na de adultos, é necessário clareza no processo educacional e estratégias com materiais adequados para o ensino.

Fonte: Assessoria