Emir Gurjão

Pós graduado em Engenharia Nuclear; ex-professor da Universidade Federal de Campina Grande; Secretário de Ciências, Tecnologia e inovação de Campina Grande; ex-secretário adjunto da Representação do Governo da Paraíba, em Campina Grande; ex-conselheiro de Educação do Estado da Paraíba.

A Paraíba e o Brasil precisam de mais Burros

Publicado em 13 de maio de 2025

Durante séculos, os jumentos (popularmente chamados de burros) foram companheiros essenciais do povo nordestino, especialmente em regiões como a Paraíba. Utilizados para transporte de água, mercadorias, e até como símbolo cultural, esses animais resistentes e humildes vêm desaparecendo silenciosamente. O motivo? Uma combinação de abandono, mecanização rural e, mais recentemente, uma indústria cruel e lucrativa: a produção do ejiao, um produto da medicina tradicional chinesa feito a partir da gelatina da pele do jumento.

Dados do IBGE mostram que a população de jumentos no Brasil caiu de 974.688 em 2011 para apenas 376.874 em 2017 — uma queda de 61% em menos de uma década.

Desde 2018, cerca de 38.600 jumentos são abatidos por ano no país, com foco na exportação de peles para a China. Isso levou a uma nova redução estimada em 60% entre 2018 e 2023.

O QUE É O EJIÃO?

O ejiao é um produto de alto valor na medicina tradicional chinesa, usado como tônico para o sangue e a pele. Ele é feito a partir da gelatina extraída da pele dos jumentos.

Um jumento adulto pesa cerca de 200 a 250 kg.

A pele representa 5% a 8% desse peso (10 a 20 kg).

Apenas 3% a 5% da pele vira gelatina: cerca de 0,5 a 1 kg de ejiao por animal.

Ou seja, menos de 1% do animal é usado, e mais de 95% é descartado, o que representa um desperdício gigantesco e uma prática ambientalmente insustentável.

SITUAÇÃO NA PARAÍBA

Embora não existam dados exatos sobre o número atual de jumentos na Paraíba, a percepção nas estradas e zonas rurais confirma o que os números nacionais já mostram: o jumento está desaparecendo.

A Paraíba, como parte do semiárido nordestino, sempre foi território de forte presença desses animais. Hoje, observadores e agricultores relatam o sumiço gradual dos jumentos em feiras, pastos e comunidades.

Se a tendência nacional se aplica à Paraíba — o que é altamente provável — o estado está perdendo um patrimônio genético, cultural e histórico sem nenhuma política pública séria para evitar isso.

CONCLUSÃO: PATRIMÔNIO EM EXTINÇÃO
O Brasil, e especialmente o Nordeste, assiste à extinção silenciosa de um animal que ajudou a construir sua história. O jumento não é apenas um animal de carga — ele é um símbolo de resistência, um bem cultural, e um recurso ecológico.

A Paraíba precisa agir. Políticas públicas de proteção, incentivo ao uso racional e valorização dos jumentos são urgentes. Se nada for feito, daqui a alguns anos o jumento poderá ser apenas uma lembrança em livros, fotos e músicas de Luiz Gonzaga.

CARRO E MOTO SUBSTITUEM O JUMENTO? QUAL É A SUA ESCOLHA?
Sim, do ponto de vista funcional em algumas regiões urbanizadas, veículos a motor trouxeram agilidade, velocidade e capacidade de carga.

Mas… isso não responde a tudo. Eis por quê:

– Custo zero de combustível: jumentos se alimentam da vegetação local. Moto e carro precisam de gasolina ou diesel, que está caro e polui.
– Acesso a terrenos difíceis: em regiões montanhosas, trilhas ou terrenos acidentados, só o jumento passa.
– Baixa manutenção: não precisa de mecânico, nem peça de reposição. Um jumento saudável pode viver 30 anos ajudando no trabalho.
– Cultura e identidade: ele é patrimônio do sertão, presente em festas, músicas e no imaginário popular nordestino.
– Sustentabilidade: o jumento é parte de um modelo de vida mais ecológico, de baixo impacto e harmonia com a natureza.

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Escrito por Emir Candeia Gurjão, que nunca andou em um jumento, às 08:08 horas do dia 13 de maio de 2025, dia de Nossa Senhora de Fátima.