A dor causada por quem tem a sagrada missão de curar

Publicado em 8 de agosto de 2024

Gabriella Cunha Lima e o tio Fernando Cunha Lima; uma dor que o tempo não prescreve

Como imaginar que alguém que abraçou o ofício de cuidar pode ser, na verdade, uma ameaça velada? Como desconfiar de que quem escolheu como profissão tratar e proteger a saúde de crianças seria um potencial abusador delas, a qualquer momento ou descuido?

A denúncia de pedofilia contra o médico pediatra Fernando Cunha Lima choca porque traz à luz a inocência indefesa sendo covardemente corrompida dentro de um ambiente sagrado para um profissional com essa angelical especialidade.

Causa ainda maior indignação quando, para a surpresa de todos, o que se denúncia em consultas era a extensão dos crimes praticados até contra o próprio sangue. Foi o que veio a público com a denúncia de duas sobrinhas, vítimas décadas atrás.

Somente a coragem da mãe de uma menina de nove anos impulsionou, finalmente, as primeiras vítimas romperem um pacto familiar de silêncio e dor que durou 30 longos anos. Um caso que, por pouco, não terminou em tragédia entre irmãos.

Ainda que tardiamente, a revelação também é corajosa. Não fosse a decisão de Gabriela Cunha Lima de superar o tempo, a vergonha e até o julgamento alheio, é possível que o status do acusado asfixiasse a denúncia e desacreditasse a mãe da vítima.

A coragem da mãe de denunciar e da sobrinha do médico revelar gerou uma espiral de força, uma corrente de solidariedade. Assim que souberam, outras famílias já procuraram a Polícia para também registrar casos de violência sexual do médico.

Mas, a essa altura, não dá pra calcular quantas pessoas que confiavam a saúde e a intimidade de suas crianças estejam, com razão, se interrogando: será que meus filhos também foram vítimas?

Uma pergunta dilacerante para inúmeras famílias que só reforça a necessidade de a Polícia Civil ser mais célere e técnica do que nunca, de a Justiça agir de forma exemplar e pedagógica e de o Conselho Regional de Medicina vencer o arraigado corporativismo e passar o bisturi na carne.

Até em defesa dos competentes, vocacionados e verdadeiros (as) pediatras. Os que honram o juramento e usam suas mãos para curar a dor de faces inocentes. Nunca para abrir feridas no coração delas.

Fonte: ‘MaisPB’ (Por Heron Cid)