Valberto José
Jornalista, habilitado pelo curso de Comunicação Social da Universidade Regional do Nordeste (URNE), hoje UEPB. Colunista esportivo da Gazeta do Sertão e d’A Palavra, passou pelo Diário da Borborema e Jornal da Paraíba; foi comerciante do setor de carnes, fazendo uma pausa de 18 anos no jornalismo.
No dia dela, a mania de um apreciador
Publicado em 12 de setembro de 2022Mantenho em casa, com todo cuidado, uma coleção de 10 copos apropriados ao trago de uma boa cachaça, todos ganhados de presente. Não é preciso que eu confirme a motivação desses mimos, disponibilizados carinhosamente por mãos bem próximas… Bebo, sim, e a bebida produzida no engenho é a minha preferida.
No tempo anterior ao da Lei Seca, costumava tomar as três do almoço. Essa disposição diária motivou a um colega de jornal, na época, a me acusar de viciado. “Mas não é um alcoólatra”, amenizou, diante de minha reação fisionômica. Com o advento da lei, passei a controlar esse arremesso de copo.
Sempre bebo controladamente, embora já tenha saído da linha nesses anos de bebida. Ao contrário do amigo Antônio Pereira Filho, que foi nosso cliente até o fechamento do estabelecimento comercial, no Jardim 40. Toinho é um alcoólatra que há mais 30 anos não bota uma gota etílica na boca.
– Quem deixa de beber é como quem mata um: sabe o dia, a hora e o porquê, costuma dizer, embora nunca tenha me confirmado o motivo de tanto tempo de abstinência. Beber uma latinha de sua cachaça preferida é o último desejo de Toinho, no ocaso da vida. “Já avisei aos meus irmãos”.
Amigo de longas datas, Lopito encantou-se por minha coleção de copos “cachaçais” e adquiriu meia dúzia daquele tipo engana bêbado, separando um para uso pessoal. Admirou-se quando, na sua visita, aproximei de Lola, o único cão que possuímos em casa, o copo cheio e ela recuou.
Tempos depois estive na casa de Lopito, retribuindo a visita, e ele fez questão de mostrar seus copos, personalizados de sua cachaça preferida. Estranhei que apenas um deles estava envolto de um plástico, justamente o que ele enchera e separou para si. “Esta é a minha”, disse, logo dosando outro copo e, automaticamente, me repassando.
Antes que eu perguntasse qualquer coisa, pediu que tomássemos logo as doses, que teria algo a me dizer. Então, levantou o copo, levou-o até ao nariz e aspirou bem forte, como a querer sentir profundamente o cheiro da bebida. Depois, fez um gesto com a boca e o nariz, levantando os olhos para o céu, feito o macho bovino quando sente o cheiro íntimo da fêmea. “Temos que agradecer”, justificou, para, então, ingerir a bebida.
Somente depois desse ritual etílico é que Lopito justificou a personalização do seu copo, ou seja, a marcação para uso exclusivo. É que a experiência de anos com a cachaça fez com ele decidisse não lavar o copo, a não ser que ele fique sujo de alguma mancha ou fragmento do tira-gosto.
Diante da suspeição de preguiça ou um meio de forçar a mulher a lavar o objeto usado, Lopito procurou externar justificativas à estranha decisão, garantindo que costuma assear os usados pelas visitas, deixando apenas o dele sob o efeito do banho etílico. “Naquela vez na sua casa a cadela recuou ao sentir o cheiro”, iniciou, acrescentando ainda que nunca viu mosca, mosquito ou qualquer outro inseto pousar num copo que foi usado na poção de cachaça.
– Ainda fica o copo sempre cheirando ao aroma de uma boa cachaça, encerrou, sem que me convencesse do resultado prático de tal experiência.
Não, não é por nada não que estou tornando público o meu vício, apontando o último desejo de Toinho e contando a experiência duvidosa de Lopito. É simplesmente porque esta terça-feira, 13 de setembro, é o Dia da Cachaça.