Diretor do IFPB de Itabaiana acusado por ex-esposa de estuprar alunas vulneráveis da instituição e que vinha sendo protegido é finalmente demitido

Publicado em 5 de outubro de 2024

Issac no dia da sua posse como diretor do campus de Itabaiana

Um dos casos mais emblemáticos de assédio sexual no Poder Público paraibano, o do então diretor geral do campus do Instituto Federal de Educação da Paraíba (IFPB) em Itabaiana, Antonio Isaac de Luna de Lacerda, chega ao seu final agora, com a publicação do ato de sua demissão, pendenga que se arrastava desde 2022 quando a ex-esposa do acusado, a engenheira de Minas Ana Paula Moreno, o denunciou e dois anos depois, em matéria publicada n’APALAVRA, considerou as autoridades que investigavam o caso de omissas e pediu para que o portal fizesse chegar ao Ministro da Educação as suas queixas.

Ana Paula Moreno, a ex-esposa de Isaac

Ana Paula Moreno, formada pela UFCG em julho de 2022 denunciou o seu ex-marido, de estar sendo investigado pela Polícia Federal (PF) na Paraíba e pelo Ministério Público Federal (MPF) com o objetivo de analisar denúncias de que ele teria assediado e mantido relações sexuais com uma série de estudantes menores de 18 anos e inconformada com o que classificara de omissão das autoridades constituídas, que estariam fazendo vistas grossas para o caso e dado cobertura ao acusado, que se mantinha com cargos de chefia na instituição, livre de qualquer punição, enviou à Redação d’APALAVRA extensa e comprometedora carta, na qual expos com riqueza de detalhes e farta documentação (áudios, prints do ZAP, matérias da imprensa, etc.) todo o ocorrido, apelando para que o ministro da Educação, Camilo Santana, tivesse conhecimento do suposto crime e autorizasse imediatas providenciais.

Consta que Isaac Luna deixou temporariamente o cargo de diretor-geral do IFPB que ocupava em Itabaiana, foi suspenso de suas funções de professor enquanto durasse a investigação, mas teria tido a cobertura conivente dos superiores e continuou com status de alta patente na instituição, aberto para cometer iguais e novos ilícitos, segundo ela afirmara.

Por envolver menores de 18 anos de idade, o caso correu em sigilo e nem a PF nem o MPF teriam, já decorridos praticamente dois anos, se pronunciado sobre a tramitação das investigações.

O MPF confirmou na época a existência de uma investigação criminal em curso para investigar o professor, mas que só iria se manifestar quando a mesma viesse a ser finalizada. O IFPB, por sua vez, também confirmou as denúncias explicando que estava realizando um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) e que enquanto esse durasse Isaac Luna seguiria suspenso de suas funções, o que a engenheira afirma não ter ocorrido, embora tenha prometido à época celeridade e ampla defesa para todos os lados.

Um dos veículos que publicou o assunto (G1PB) entrou em contato tanto com Antônio Isaac Luna de Lacerda como com seu advogado, César Figueiredo. Isaac explicou que só o advogado falaria em nome dele. César, por sua vez, explicou que estava reunido com o seu cliente para deliberar sobre a questão.

Segundo o G1PB, cerca de duas horas depois o advogado César Figueiredo voltou a entrar em contato para dizer que, “em virtude do processo tramitar em segredo de justiça e tratar de intimidades, a defesa iria se resguardar no direito de se manifestar apenas nos autos”. E completou dizendo que, “de antemão, afirma que não houve indiciamento nem condenação”.

A engenheira Ana Paula é a pessoa que protocolou as denúncias contra o professor Antônio Isaac Luna. Até 2019 ela era a esposa de Isaac, mas diz que a separação acabou acontecendo depois que estudantes do próprio IFPB a procuraram para dizer o que vinha acontecendo no campus.

Ela explicou que quando o confrontou pela primeira vez, o professor negou as denúncias e disse que tudo não passava de difamações contra ele. Mas que, não tardou, outras evidências foram aparecendo, até ele flagrar o professor na presença de uma das alunas. A partir daí, a relação entre Isaac e Ana Paula chegava ao fim em definitivo.

Ana Paula destacou para o G1PB que o casal morava em Campina Grande e Isaac viajava regularmente para Itabaiana para dar aulas, mas que vinha utilizando um apartamento de veraneio de João Pessoa para levar as alunas. Teria sido nesse apartamento que ela o flagrou com uma das estudantes do IFPB.

Tudo começou três anos antes de 2022, quando um estudante a procurou pelas redes sociais para falar do que vinha acontecendo em Itabaiana, dizendo que fazia isso para alertá-la. Depois disso, estimuladas por esse primeiro estudante, outras meninas (entre 14 e 17 anos, segundo a denúncia) também teriam contado os seus relatos. Os nomes foram omitidos na reportagem porque os estudantes eram menores de 18 anos ou ao menos eram na época dos fatos.

Ana Paula ponderou também que o IFPB foi informado das denúncias, que os estudantes tentaram denunciar o professor pelas vias institucionais em várias oportunidades, conversando inclusive com o próprio reitor, Cícero Nicácio, mas que a instituição “abafou o caso”. Foi depois da inércia da instituição que Ana Paula teria decidido oficializar uma denúncia nas esferas criminais. Contra o professor, mas também contra a Reitoria do IFPB por prevaricação.

Sobre a questão, o IFPB informou na ocasião ao G1PB que sempre que recebe alguma denúncia, essa é imediatamente apurada. Que em 2019 tomou conhecimento de denúncias acerca de assédio sexual no campus de Itabaiana, sem no entanto indicações de quem seria o autor. À época, o Conselho Disciplinar Estudantil abriu uma sindicância, mas não foi possível identificar nem assediadores nem assediados.

Apenas mais recentemente, em 2022, é que teria chegado à Reitoria um áudio anônimo em que o professor Antônio Isaac Luna de Lacerda fora citado nominalmente. Teria sido nesse momento que o PAD foi aberto e o professor afastado.

O IFPB confirmou ainda que alguns estudantes conversaram com o reitor Cícero Nicácio em 2019, mas que essas teriam sido conversas informais. Nenhuma prova teria sido apresentada e nenhuma denúncia formalizada. Disse também que a Reitoria tentou conversar com os estudantes e os respectivos pais e responsáveis, mas que esses não compareceram ao encontro. A instituição de ensino afirmou também que é “implacável com casos de assédio” e que recentemente um professor teria sido demitido do campus de João Pessoa por esse motivo.

O GIPB teve acesso ao conteúdo da denúncia protocolado no MPF. Ana Paula explica que não tinha se pronunciado ainda sobre a questão justamente por causa do sigilo imposto pelos órgãos investigadores, mas aceitou dar suas versões do fato depois do documento ser publicizado.

– “Meninas entre 14 e 17 anos foram assediadas. Algumas me contaram que perderam a virgindade com ele. Que foram enganadas, porque ele prometia um futuro junto com elas. Outras, que não cediam, sofriam constrangimentos. Uma das meninas deixou o IFPB porque não aguentou toda a situação”, afirmou Ana Paula.

Ana Paula Moreno explica que conseguiu mapear algo em torno de 30 casos de assédio cometidos pelo ex-marido, mas que nem todas as meninas quiseram se expor. Algumas por medo, algumas por não entenderem ainda a gravidade dos casos. E que, assim, na denúncia se limitou a citar seis pessoas que enviaram “prints” das conversas com o professor. Focou, portanto, ainda segundo ela, nos casos em que possuía provas para apresentar.

A denúncia é um documento de quase 100 páginas, que descreve cronologicamente os fatos entre 2019 e 2022 e como Ana Paula ficou sabendo dos casos, como conversou por redes sociais com muitas dessas meninas, como teria ficado sabendo do assédio e de diálogos inapropriados que o professor tinha com as estudantes. Trata também das denúncias feitas ao IFPB e como as estudantes se sentiam frustradas e inseguras por causa da inércia institucional.

O documento (em poder d’PALAVRA) possui inúmeros “prints” de conversas realizadas por meio de bate-papo em redes sociais, muitas com conversas sobre sexo e encontros amorosos. Seriam entre as estudantes menores de 18 anos e o professor. Tem também a reprodução de uma conversa em que ele supostamente ameaça a ex-esposa.

– “Eu ando com medo. Tenho medo dele saber onde estou e fazer alguma coisa”, finalizou na época.

A CARTA PARA ‘APALAVRA’

A carta que foi enviada por Ana para a Redação d’APALAVRA:

“Excelentíssimo Senhor jornalista Marcos Marinho:

Meu nome é Ana Paula Moreno (sou Engenheira de Minas, formada pela UFCG – Campina Grande).

Venho, muito respeitosamente, solicitar ajuda e apoio de Vossa Excelência para que seja divulgado e chegue nas mãos do MINISTRO DA EDUCAÇÃO (Camilo Santana), onde vou revelar em público para o BRASIL, em especial a nossa PARAÍBA, uma série de Assédios Morais, Tráfico de Influência e Abusos Sexuais que vinha ocorrendo desde 2019 contra alunas menores de idade do IFPB – Campus Itabaiana, praticados pelo suposto assediador, repito que desde 2019, pelo Ex-Diretor Geral, ANTÔNIO ISAAC LUNA DE LACERDA, que já vinha supostamente praticando esses atos desde o Campus Cajazeiras-PB (quando veio à ser removido por ajuda e apadrinhamento do ex-reitor seu amigo prof. Cícero Nicácio), que na época de 2016-2019, infelizmente, esse assediador foi meu companheiro/cônjuge, e descobri tudo e todas mensagens e provas.

Acima de tudo, esse suposto assediador de alunas menores, de todas as coisas está sendo protegido e blindado por GESTORES MÁXIMOS da Instituição IFPB (REITORIA), tentam abafar e jogam para debaixo do tapete o caso, desde o ex-reitor CÍCERO NICÁCIO e a atual Reitora MARY ROBERTA, em conluio com integrantes da Comissão Interna de Processos de Sindicância (COPSPAD-RE), principalmente o Presidente de nome VALDEREDO ALVES DA SILVA, que ambos juntos com o assessor especial da reitoria, tiveram a audácia e coragem de coagir o aluno testemunha-chave-vítima FELIPE TARGINO DO NASCIMENTO, e impressionante que a coação foi praticada por um assessor especial da reitoria (AGUINALDO TEJO FILHO), tudo registrado, documentado e gravado áudio da coação.

Os gestores se utilizam da máquina pública (a instituição IFPB) para macular informações, e repassar relatórios distorcidos, falsos testemunhos e mentiras para os órgãos externos, tentando ludibriar os olhos da justiça, para induzir ao erro.
De fato e factível esses gestores comentaram o Crime de Prevaricação (isso é fato).

Mas, a quem interessa manter ainda o suposto assediador no emprego com tantas provas verdadeiras e factíveis? Além do mais recebendo proventos (de salário bruto na íntegra de R$ 19.683,41 e auxílio de insalubridade sem estar no ambiente insalubre, com ajuda do ex-reitor Cícero Nicácio).

Não é fácil falar, relembrar tudo que aconteceu, eu estou traumatizada, tenho insônia, depressão, muitos traumas e sequelas de agressões físicas e morais por parte do acusado, assediador e denunciado ANTÔNIO ISAAC LUNA DE LACERDA. Imagine as alunas vulneráveis e indefesas???

Não iria imaginar que ANTÔNIO ISAAC LUNA DE LACERDA, meu ex-companheiro/cônjuge, na época, Diretor Geral de um Campus do IFPB, estava tendo e mantendo relações com as várias alunas, meninas jovens de 14 anos de idade. Muitas delas da zona rural, de baixa renda, indefesas, vulneráveis, carentes e acima de tudo com sonhos, esses sonhos interrompidos por esse assediador molestador tarado. E sem acreditar, protegido pelos amigos GESTORES do IFPB.
Tenho várias provas documentais, print’s, conversas, áudios das vítimas e testemunhas, inúmeros print’s dele assediando diversas meninas pelo Instagram, de teor sexual, dizendo que “…vai entrar fácil…”, que “…ela nem ia sentir…”. Tenho print’s de uma aluna menor de idade, dizendo que “…ele tirou a virgindade dela e que está arrependida…”.

Dentre outras várias provas e confissões de possível aborto e o testemunho e a confissão do ato sexual praticado na própria sala do mesmo ex-diretor.

Tenho áudios e print’s de pedagogas, assistentes sociais e servidores (docentes e técnicos-administrativos) comprovando a veracidade das informações e além do fato da REITORIA do IFPB ficar sabendo e soube de tudo por documentos públicos oficiais, mensagens, vinda da Reitoria no Campus Itabaiana pela chamada visita in loco Reitoria Itinerante, e fizeram melhor fechar os olhos e colocar para baixo do tapete o caso, para proteger o amigo assediador, usando a Comissão Interna de Sindicância COPSPAD-RE, composta por amigos do ex-Reitor e da atual Reitora para macular as informações.
Deixo claro que os Gestores Máximos do IFPB sempre foram coniventes, omissos e cometeram o Crime de Prevaricação.

A imprensa abafou o caso.

A Paraíba precisa saber o que ex-diretor do IFPB e demais gestores fizeram com suas alunas menores de idades, e que até agora está impune pela Reitoria do IFPB, que usam de processos internos para coagir testemunhas como fizeram para mudar os depoimentos e passar para os órgãos externos competentes falsas informações e induzir ao MPF ao erro.

Quero que a justiça seja feita e todos paguem.

Assim. Preciso da ajuda de Vossa Excelência para que chegue ao conhecimento do Ministério da Educação (Ministro Camilo Santana)”.

A engenheira já procurou também a ouvidoria do Ministério da Educação, mas a denúncia não foi apurada, segundo ela.

O ATO DA DEMISSÃO

A portaria de demissão de Isaac está assinada pela reitora do IFPB-Itabaiana, que no uso de suas atribuições legais considerando a subdelegação de competência constante da Portaria MEC nº 430, de 05/05/2009, publicada no Diário Oficial da União do dia 07 subsequente, e considerando, ainda, o que consta no processo nº 23381.001655.2022-87, 23381.001655.2022-87 RESOLVEU:

– Art. 1° Aplicar a penalidade de demissão ao servidor ANTONIO ISAAC LUNA DE LACERDA , matrícula SIAPE nº 1921350, ocupante do cargo de Professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, do quadro permanente de pessoal do Instituto, com lotação no Campus Itabaiana, por ter incorrido na prática das infrações e conduta reprovável, tipificadas nos artigos 116, incisos I, II, III e IX, 117, inciso IX; e 132, incisos V e XIII, todos da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

O ato em seu Art. 2º declarar vago o referido cargo, entrando em vigor imediatamente.

AMEAÇA DA IFPB

Ante a grande repercussão da matéria n’APALAVRA, a diretora de Comunicação e Marketing do IFPB, Mayara Guimarães, enviou carta à redação d’APALAVRA garantindo que o dirigente acusado de estupro e assédio sexual estava afastado das funções desde 2022 e, em velada ameaça ao portal, disse que adotaria medidas judiciais “contra quem denegrir o nome da instituição”.

Segundo Maiara, o caso estava sendo devidamente apurado em caráter sigiloso, no curso de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), e que o dirigente acusado se encontrava afastado das suas funções desde 2022.

Ela ressaltou: “denúncias inverídicas que afetem a imagem do IFPB, bem como a honra de seus dirigentes e servidores, serão devidamente acompanhadas pela Procuradoria Federal que atua junto à instituição e, caso se identifiquem crimes de calúnia e difamação, serão adotadas as devidas medidas judiciais”.

Segue o ato de demissão de Isaac:

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Fonte: Da Redação